quinta-feira, 20 de maio de 2010

Entrevista - Ikonoklasta


Ikonoklasta é o nome de um dos melhores MC's de Angola que conta já com vários mp3chos (músicas) e maquetes produzidas, pois segundo palavras do próprio "nao tenho album nem tenho pressa de ter". Para além disso tem várias participações em albuns de MC's portugueses como Valete ou VRZ .
É ainda de frisar que mesmo sem albuns produzidos e com poucas condições este MC tem músicas excelentes com letras fortes e conscientes que nos alertam para o mal da sociedade.


Tendo em conta o seu talento e as suas ideias, que vão ao encontro do objectivo do nosso trabalho, enviámos-lhe um pedido para uma entrevista e ele aceitou. Achámos então útil publicá-la aqui no Blogue para também dar a conhecer as ideias deste MC que são bastante interessantes.

Entrevista a Ikonoklasta
Hoje em dia, com o processo de globalização, os fluxos migratórios têm-se acentuado, o que leva a que as diferentes culturas tenham uma maior interacção e, por sua vez, exista uma maior mistura entre as mesmas. A música é disso um exemplo. É sobre esse mesma mistura que vamos focar a entrevista, fazendo a ligação com o hip-hop.

1.Existem cada vez mais minorias étnicas (imigrantes nomeadamente) nos países desenvolvidos. Como achas que a chegada de imigrantes contribui para enriquecer um país?
Nas grandes metrópoles, só os cidadãos que se esforçam para ser pitosgas “desconseguem” de ver a contribuição do imigrante para as suas sociedades. O imigrante faz TODOS os trabalhos que os locais consideram ser do mais baixo escalão, tudo aquilo que não estejam dispostos a fazer seja por menos aptidão física, seja por uma questão de estatuto. Sem imigrantes a construcção civil na Europa estagnaria. Depois, aprecie-se a concentração de imigrantes no segmento da limpeza e a desproporção local/estrangeiro é flagrante se tivermos em conta o universo da população. Isso quer dizer que a Europa seria mais suja sem os imigrantes? Não necessariamente, mas os custos para o saneamento básico seriam muito mais elevados já que, nas suas terras respectivas, poucos europeus se sujeitam a trabalhar nessas áreas pelos salários praticados. Há mais um aspecto muito importante e, parece-me a mim, PROPOSITADAMENTE ofuscado no tema da imigração, que é o facto sustentado estatisticamente da sua contribuição inestimável na taxa de natalidade dos países europeus que estavam a tornar-se progressivamente mais velhos, o que viria complicar sobremaneira o sistema da segurança social, onde os activos sustentam os reformados. Países como a Alemanha chegaram a meter em prática sistemas de incentivo à natalidade porque a situação se estava a tornar preocupante. Por isso, bem hajam os imigrantes.


2.Hoje em dia associa-se mais kizomba, funaná, kuduro (etc) à música africana. Porém, o hip-hop, rap é muitas vezes associado a “musica de pretos” (desculpem-nos a expressão) e não sendo “música africana”. Porque razão achas que isso acontece? Achas que é uma expressão ultrapassada e preconceituosa?

Isso é um problema das pessoas que fazem esse tipo de associação, eles lá sabem que tipo de educação tiveram, ou não. Música africana em geral é sempre rotulada de música de pretos, pois África continua a ser vista como o continente dos pretos, o continente “escuro”. Se é ultrapassada e preconceituosa? Ultrapassada pelos vistos não é né? Se ainda há quem escolha empregar esse tipo de vocabulário redutor para a definir. Preconceituosa indiscutivelmente, mas aí também podemos entrar num debate filosófico sobre o que é o preconceito. Dividindo a música por géneros e associá-los a um certo tipo de pessoa que se veste de maneira A ou B, não estamos já a incorrer nesse mesmo preconceito? Deixem lá estar quem é limitado e vê as coisas tão curtas. Não poderão saborear a felicidade do esclarecimento.

3.O que pensas da actividade de intervenção social realizada pelo hip-hop?Consideras que a tua música tem essa vertente social?

Eu gostaria de pensar que sim. Mas eu acho que os artistas se acomodam demais no “faço a minha parte fazendo música, despertando mentes que supostamente irão agir em conformidade com a palavra que apregoo”. Cansam-me os discursos. Eu gosto de ver coisas concretas como faz o Chullage por exemplo, envolvendo-se com a comunidade de uma maneira mais CARNAL. Acho que nesse aspecto eu e a minha música ainda temos um longo caminho a percorrer, assim como a maior parte dos suspostos “revolucionários” de truta e meia, os pretensiosos músicos que acham que estão a mudar a sociedade com as suas palavras.

4.Como explicas o nascimento e o desenvolvimento do hip-hop em zonas mais desfavorecidas e diversificadas culturalmente, nomeadamente em bairros sociais?

As coisas não têm de ser explicadas. Elas são normalmente espontâneas. A arte sempre foi uma maneira de as pessoas extravasarem o que não conseguem exprimir tão bem em palavras e, nesse sentido, sempre foi um reflexo da vivência do seu praticante. O Hip Hop nasceu no sítio mais natural possível assim sendo e sem grandes explicações históricas que contextualizem a sua aparição, vamos ficar por isso mesmo: nada mais natural do que uma forma de expressão dos oprimidos nascer onde os oprimidos se congregam.

5.Quais foram as convicções que te levaram a enveredar pelo hip-hop?

“Ódio pela outra banda não é motivo para nada” (auto-quote). Não foram convicções nenhumas. Aos 13 anos não se tem convicções, só um bocado de parvoíce, excesso de confiança e amor pela música.

6.É possível dizer que o hip-hop é mais ouvido, em Portugal, e tem abrangido um maior número de pessoas. A que achas que se deve isso?

Os Os malucos que organizavam as pequenas festas, que fundaram o movimento, que iam ao (extinto?) Ritz em Lisboa ou ao Hard Club no Porto, esses malucos já são pais. Já são pelo menos duas gerações de existência do género em Portugal. O facto da música se ter tornado bastante mais séria, adulta, consequente e credível terá também muito a ver, mas vamos dar crédito onde ele é merecido, existe um artista singular que quase sozinho expandiu o universo de ouvintes para proporções dantescas: o Sam the Kid. É talvez o artista hip hop mais completo do panorama lusófono, e mesmo tendo as suas “carecas”, consegue reunir em si uma panóplia tal de ingredientes que o mais cáustico dos críticos é forçado a reconhecer-lhe “alguma coisa”.



7.Consideras que hoje em dia o hip-hop tem influências várias? Tem-se dito que o hip-hop tem ganho novas sonoridades com introdução de novos instrumentos. Achas que o hip-hop deve seguir essa linha de diversidade?

Tem sim senhor. Ainda bem. A música deve estar PURGADA de puristas para que não estagne. Se o Hip Hop não tivesse influências várias e não continuasse a evoluir (provavelmente para dar nascença a afluentes mais tarde) hoje ainda estaríamos todos a fazer Planet Rocks e The Messages.



Nós agradecemos muito ao Ikonoklasta por nos ter respondido e dado a sua visão e opinião, estas serão uma mais-valia para o nosso trabalho.

2 comentários:

  1. As Estações do Ano1 de junho de 2010 às 13:44

    Soube que o vosso trabalho chegou ao fim. Ou terá começado agora? Ou irá continuar? Ah, estas minhas distracções!

    De qualquer forma, os meus parabéns pelo blogue!
    Esta nova forma de comunicar, é também ela uma nova forma de aprender, de ensinar, de criar ...

    O melhor para o futuro que se avizinha!

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  2. O ano lectivo está a chegar ao fim e o Cultural(mente)? Espero que não! Li com atenção alguns dos vossos posts que me fizeram reflectir e pensar.

    Muitos parabéns pelo vosso blogue!
    Esta nova forma de comunicar é também, ela, uma nova forma de aprender, de ensinar, de criar e de partilhar.
    A blogosfera é também um lugar de encontro. Espero continuar a encontrar-vos por aqui.

    O melhor para o vosso futuro!

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